3_ «O ISET ERA FORMAÇÃO, A FNE NEGOCIAÇÃO»
Na terceira e última parte desta entrevista, Conceição Alves Pinto, ex-Presidente do SDPGL, recorda as ligações e o peso que o Instituto Superior de Educação e Trabalho (ISET) teve na formação de professores e não docentes em Portugal e traça os caminhos que permitem desbravar as propostas de ação sindical no futuro.
JORNAL FNE (JF) – Em 1991 foi criado o ISET, onde a professora Conceição lecionou durante muitos anos. Como avalia o papel do ISET?
Conceição Alves Pinto (CAP) – Na FNE debatia-se a fundo um dos problemas a que a federação teria que dar resposta, no âmbito do Estatuto da Carreira Docente, e que tinha que ver com a prestação de contas, numa modalidade que não fazia parte da experiência dos professores.
No âmbito da FNE, Manuela Teixeira e eu concebemos um percurso de formação, a partir de 1989, que denominamos “Currículo e Relatório”. Construímos em conjunto com os sindicatos docentes da FNE um enorme projeto nacional para responder às necessidades de formação insistentemente solicitadas pelos sócios dos nossos sindicatos. Este projeto começou pela preparação de um conjunto bastante alargado de formadores para monitorarem as sessões prá- cas deste curso, que complementavam as sessões teóricas realizadas por Manuela Teixeira e por mim.
A FNE respondeu às solicitações de todos os sindicatos organizando esta formação em quase todos os distritos do país, assim como nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Houve toda uma dinâmica muito interessante que produziu resultados não só nas escolas como nos nossos sindicatos. Por exemplo, para o meu sindicato (SDPGL) esses cursos foram um espaço de formação para muitos docentes que viriam a tornar-se dirigentes sindicais. Encontrei a mesma situação nos outros sindicatos, porque os professores viram nesses cursos uma forma de encontrarem soluções melhores para ajudar profissionalmente os colegas.
A partir desta experiência, muitos professores nossos sócios começaram a descobrir que fazer formação era de grande utilidade para problematizar e explicitar o que nós queremos, quando estamos a trabalhar com os alunos.
Na sequência das necessidades transmidas pelos sócios dos sindicatos seguiu-se uma lógica de disponibilizar formação acrescida aos professores que lhes permitissem ser reconhecidas em carreira. Tudo isto decorreu da nossa políca sindical, mas progressivamente estruturou-se de forma autónoma no ISET. A nossa visão sindical não é apenas de reivindicações sindicais ao nível salarial. Temos consciência que somos atores e intervenientes na conceção e apresentação de propostas no âmbito da política educava. Conceção que foi reconhecida pelo ministro João de Deus Pinheiro ao chamar Manuela Teixeira para integrar a Comissão da Reforma do Sistema Educativo. Foi isso que me atraiu na FNE. Sempre achámos que o prestígio dos professores estava ligado com a capacidade de explicitar tudo o que faziam e como faziam. E isso exige uma formação/desenvolvimento profissional acrescida ao longo da vida.
A nossa visão sindical não é apenas de reivindicações sindicais ao nível salarial. Temos consciência que somos atores e intervenientes na conceção e apresentação de propostas no âmbito da política educativa.
JF – Depois do ISET, os sindicatos da FNE criaram a Associação para a Formação e Investigação em Educação e Trabalho (AFIET), um grande projeto para jovens e adultos que querem aumentar a sua formação. Qual é o espaço que a Dimensão Social ocupa na formação?
CAP – No início havia a Associação ISET e o ISET Instituto. Mas o Ministério da Educação fez alterações na legislação e a Associação detentora do Instituto não podia ter o mesmo nome. Por isso optou-se por se chamar AFIET à Associação ISET. Enquanto o ISET funcionou, as funções de formação não graduada foram assumidas pelo Instituto. A AFIET é importante para desbravar ideias para espaços de criatividade, de modo que entendamos que linhas queremos desenvolver. Neste momento vejo a AFIET como um espaço que contribui para a criatividade, desenvolvimento e aprofundamento de linhas, que depois são operacionalizadas pela FNE em propostas sindicais, nas reivindicações e políticas, nas suas intervenções sobre política educativa.
JF – O ISET, a AFIET e a FNE despenderam um grande esforço para elevar as qualificações dos educadores, professores e não docentes e melhorar os seus salários. O que falta ainda cumprir?
CAP – Quem lutou por uma carreira que revalorizou fortemente a função docente foi a FNE. Do ponto de vista da revalorização salarial tínhamos conseguido que o topo salarial dos professores licenciados do preparatório e secundário fosse equiparado ao topo dos técnicos superiores. Com a transição do regime de fases para a carreira docente, no final dos anos 80, a FNE exigiu que o topo das fases anteriores correspondessem ao 7º escalão e que se abrisse um nível acima, de três escalões, para quem quisesse candidatar-se a esse prolongamento de carreira. Um dia que se faça a história deste processo negocial verificar-se-á que a proposta da federação concorrente da FNE era muito menos ambiciosa do que a nossa. Claro que aos novos três escalões de topo não se tinha acesso apenas com a avaliação por relatório. Era necessário uma prestação de contas mais exigente.
Num texto que publiquei no semanário Expresso eu dizia que era algo semelhante à abertura de um novo troço de autoestrada e que para aceder a esse troço importava pagar uma portagem que se traduzia na candidatura ao 8º escalão. A FNE defendeu de forma determinada que todos os docentes do básico e secundário (assim como os educadores de infância), para habilitações de nível igual, fossem integrados nos escalões que decorressem do seu tempo de serviço. Como os professores do ensino primário estavam várias fases abaixo dos do preparatório e secundário foram eles que tiveram a maior revalorização. Mas todos eram livres de se candidatarem ao 8º escalão e subsequentemente ao 9º e ao 10º. Primeiro foi aprovada a estrutura da carreira docente (Decreto-Lei n.o 409/89 de 18 de Novembro). O Estatuto da Carreira Docente é publicado no Decreto-Lei no139-A/90 de 28 de abril. O ISET surge para responder a necessidades de formação de docentes e não docentes. O ISET nunca capacitou os educadores e professores com habilitações iniciais. Havia muitas instituições de ensino superior que o faziam. Concentrámo-nos, pois, inicialmente em organizar formação correspondente a acréscimos de formação. Mas decorrente da urgência da procura dos docentes por formações conducentes à obtenção de novos graus académicos e de especializações, os primeiros anos do ISET centraram-se na formação conducente ao grau de licenciado no âmbito do DESE (Diploma de Estudos Superiores Especializados). Optámos por dar formação em Administração Escolar, uma vez que o sistema educativo estava muito carente de docentes com essa formação. Posteriormente a par da Administração Escolar introduzimos as áreas de “Animação Sócio Cultural”, “Gestão e Animação da Formação” e “Orientação Educativa “.
A FNE defendeu de forma determinada que todos os docentes do básico e secundário (assim como os educadores de infância), para habilitações de nível igual, fossem integrados nos escalões que decorressem do seu tempo de serviço.
Os mestrados que funcionaram foram todos em Educação, um em Administração Educacional e outro em Animação Sociocultural. Mais tarde abrimos duas licenciaturas para não docentes, uma em Administração Escolar e outra em Intervenção Educativa. E finalmente já nos anos finais funcionaram dois cursos de Especialização Tecnológica, um em Acompanhamento de Crianças e Jovens e outro em Técnicas de Gestão e Administração de Organizações. Complementarmente a estes cursos conducentes a novo grau académico organizámos formação especializadas reconhecidas para o desempenho de funções docentes específicas em Administração Escolar, em Educação Especial (domínio emocional / personalidade), em Supervisão Pedagógica e Formação de Formadores, em Supervisão Pedagógica e Avaliação Docente, em Orientação Educativa e em Comunicação Educacional e Gestão da Informação. O ISET preocupava-se com a formação; a questão salarial e as questões de negociação eram com a FNE.
Mas se em termos quantativos formamos muitos docentes e não docentes, aquilo que mais nos satisfaz foi a qualidade da formação, que foi sempre a nossa prioridade, e que foi reconhecida pelos nossos ex-alunos e por muitos professores universitários de outras instituições.
Principais Cursos Ministrados no ISET a Docentes, Não Docentes e outros | Inscritos | Concluíram |
---|---|---|
Cursos conducentes ao grau de Licenciado | 2373 | 1989 |
Cursos conducentes ao grau de Mestre | 118 | 63 |
Curso de Especialização Tecnológica | 26 | 23 |
Cursos de Formação Especializada, ao abrigo do Decreto-Lei no 95/97, de 23 de abril: Administração Escolar, Orientação Educativa, Comunicação Educacional e Gestão da Informação, Educação Especial – domínio emocional/personalidade, Supervisão Pedagógica e Formação de Formadores, Supervisão Pedagógica e Avaliação Docente. | 1194 | 1065 |
Pós-Graduação em Administração Escolar, Educação Especial – domínio emocional/personalidade , Comunicação Educacional e Gestão da Informação, Orientação Educativa. | 46 | 45 |
Mas se em termos quantitativos formamos muitos docentes e não docentes, aquilo que mais nos satisfaz foi a qualidade da formação, que foi sempre a nossa prioridade, e que foi reconhecida pelos nossos ex-alunos e por muitos professores universitários de outras instituições
Fonte: FNE
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