Em conferência de imprensa realizada esta manhã, a FNE deixou o alerta para que a prioridade da tutela no ano letivo de 2022-23 passe pela melhoria dos salários e das condições de trabalho de docentes e não docentes.
No final de mais um ano letivo, João Dias da Silva, Secretário-Geral (SG) da FNE, considerou que “terminamos este ano de 2021/2022 sem que o Governo tenha resolvido os problemas mais conhecidos de que enferma o sistema educativo e o que é ainda mais dramático sem que nada tenha sido feito para que esses problemas não se repitam no ano que está para começar”.
Deixando elogios “à importância do trabalho desenvolvido pelos educadores e professores portugueses nos tempos de pandemia”, o SG da FNE recordou que “a verdade é que tardam as medidas que reconheçam o empenho e a dedicação que marcaram esses tempos difíceis, que demonstraram como esses profissionais foram indispensáveis para que nenhum aluno tivesse ficado esquecido. Não se pode é permitir que agora os educadores e professores portugueses fiquem esquecidos e para trás, profissionalmente desvalorizados”.
A instabilidade e precariedade foram lembrados como problemas que continuam a repetir-se, sem apresentação de soluções por parte do Ministério da Educação (ME), assinalando o SG da FNE que “continua a não se garantir que os alunos tenham todos os seus professores, porque o Governo se recusa a adotar medidas vigorosas que respondam aos problemas identificados, quer em termos de concursos, quer de atratividade dos horários, quer de apoio aos docentes deslocados para longe das suas famílias.”
A matéria da mobilidade por doença não ficou fora deste balanço com Dias da Silva a afirmar que “quer em relação às medidas que visam a redução do número de alunos sem professor, quer em relação às mudanças que foram impostas para a aplicação do regime de mobilidade por doença, o ME foi incapaz de respeitar critérios elementares de justiça e de respeito. O efeito prático e imediato que delas resulta é a insatisfação dos educadores e professores portugueses”.
Mais do que as medidas conjunturais em relação à possibilidade de renovação de contratos de horários incompletos ou de completamento desses horários em algumas regiões do país, a FNE pede a imposição de soluções que promovam a estabilidade, nomeadamente através da realização de concurso que leve ao preenchimento das vagas que venham a ser criadas, para que todas as escolas tenham um quadro estável de docentes, sem necessidade do recurso sistemático à contratação e à precariedade.
A fechar este tema, João Dias da Silva disse ainda que se torna “inadiável que sejam adotadas medidas que visem compensar os docentes que são obrigados a grandes deslocações para garantirem as aulas aos seus alunos”.
Limitações do tempo de trabalho
As limitações que estão impostas ao desenvolvimento da carreira docente, fazendo com que milhares de professores estejam sem perspetivas de acesso a patamares remuneratórios superiores, devido à limitação de vagas no acesso aos 5º e 7º escalões, foi outro dos assuntos referidos neste encontro da Federação com os jornalistas, assim como os limites do tempo de trabalho. Para João Dias da Silva, “os docentes continuam a ser vítimas de uma intensidade excessiva do trabalho que lhes é imposto por uma Administração que se recusa a respeitar os limites do tempo de trabalho e a eliminar os procedimentos administrativos e burocráticos tantas vezes inúteis que preenchem todo o tempo, sem que haja condições para se conciliar a atividade profissional com o tempo de vida pessoal e familiar”.
Estas verificações estão espelhadas nos resultados da Consulta Nacional que foi promovida pela FNE entre um e oito de julho de 2022 e que contou com 2. 668 respondentes, o que representa uma larga margem de representatividade, que constitui um espelho do que pensam os docentes portugueses.
Daqui resultou que se torna imprescindível a adoção de medidas urgentes, nomeadamente:
– a clarificação dos conteúdos das componentes letiva e não letiva de estabelecimento, garantindo que na componente letiva se integram todas as atividades educativas realizadas pelo docente com qualquer número de alunos;
– a simplificação/eliminação de suportes digitais redundantes e/ou supérfluos;
– a eliminação de todos os procedimentos burocráticos considerados inúteis, canalizando o tempo dos docentes para o processo de ensino-aprendizagem.
Fundamental investir na educação
O investimento na educação esteve também na ordem dos temas que marcaram negativamente este ano letivo, sendo considerado fundamental pela FNE “que se garanta a disponibilização de uma oferta educativa de qualidade, efetivamente inclusiva e que promova a efetiva recuperação das aprendizagens perdidas com garantia de equidade”.
Para a FNE, são vários os processos negociais a necessitar de andamento por parte do Governo: “É essencial que se integre de uma forma articulada as medidas que visem quer o rejuvenescimento da carreira docente, quer a promoção da atratividade da profissão, garantindo a plena recuperação do tempo de serviço que esteve congelado e a substituição do atual modelo de avaliação de desempenho, que tanto mal-estar tem promovido nas escolas, determinando condições de acesso à pré-reforma e um regime especial de aposentação, complementado com a referência aos aumento de salários.
“É imprescindível”, sublinhou o SG da FNE, “passar desta inação para a determinação, em sede de diálogo e concertação, de medidas que se orientem no sentido de melhorar os salários e as condições de trabalho no setor da Educação, para fazer crescer a atratividade da profissão”.
A precariedade continua a marcar o dia a dia de docentes e não docentes “e é preciso acabar com esses índices que continuam a marcar a vida profissional de muitos profissionais em todo o sistema educativo”.
Ao nível do ensino superior, para além de medidas que impeçam o recurso sistemático à precariedade, nomeadamente no setor da Investigação, a FNE pede a revisão do regime jurídico das instituições, lamentando que “tarda o início de um processo negocial efetivo, que vise a resolução dos problemas identificados”.
A FNE continuará também a insistir na determinação dos conteúdos funcionais específicos dos Trabalhadores Não Docentes, com vista ao estabelecimento das respetivas carreiras especiais.
Ao nível do Ensino Português no Estrangeiro, a FNE garante continuar a lutar “pela preservação de uma oferta consistente dirigida à comunidade emigrante portuguesa, eliminando a propina que continua a ser imposta nos cursos maioritariamente frequentados por alunos portugueses e lusodescendentes e, em relação aos Docentes, promovendo a sua valorização salarial e a identidade de diretos em relação aos que trabalham no País, nomeadamente no respeitante à vinculação e estabilidade laboral. Para a FNE, é fundamental que se concretize o início do processo negocial recentemente anunciado pelo Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, com vista à revisão do Regime Jurídico do Ensino Português no Estrangeiro”.
João Dias da Silva sublinhou ainda que “no âmbito do ensino promovido pelos setores privado e social, não deixaremos de continuar a trabalhar no sentido da determinação de adequados instrumentos de regulamentação do trabalho, com a consequente valorização salarial e de condições de trabalho dos Trabalhadores abrangidos”.
FNE pronta para desafio do novo ano
Em jeito de balanço final, o SG da FNE acrescentou que “vamos para um novo ano letivo, em que seremos assumidamente combativos, para que se possam definir novos horizontes para os profissionais da Educação, para que se respeitem os limites do tempo de trabalho, para que os salários sejam compatíveis com as exigências a que a escola de hoje responde, para que se acabe com as precariedades que se acentuam de ano para ano”.
Para tal a FNE refere que “é preciso que se volte a respeitar o primado do trabalho pedagógico que se desenvolve nas escolas, porque é esse o serviço que essencialmente aí se tem de concretizar. É imprescindível que os educadores e professores possam desenvolver o seu trabalho específico, com o apoio dos trabalhadores que forem indispensáveis, para que as escolas funcionem e para que os alunos disponham dos mecanismos de apoio complementar à ação pedagógica considerada essencial”.
A fechar, ficou o desafio ao ME: “Vamos apresentar ao ME um caderno reivindicativo com a proposta da respetiva agenda negocial, que permita resolver os problemas por nós identificados. Esperamos que o ME se mostre disponível para essa negociação e que passe, de meros anúncios ou medidas pontuais, aos atos. A FNE está pronta para esse desafio. Esperamos que o ME, também. Pela parte da FNE, tudo faremos para que se produzam as mudanças que são necessárias”.
Jornal FNE - julho 2022
Mais de 80% dos docentes queixam-se de "trabalho burocrático inútil" (LUSA)